Por Carla Albuquerque
Como obter mais colaboração de pessoas muito competitivas?
A pergunta acima surgiu em uma recente conversa¹, entre pessoas que se dedicam a viver de forma mais colaborativa, e representa um tema recorrente para os que acreditam nos benefícios da relação ganha-ganha. Seja no ambiente pessoal ou profissional, a cultura ainda move muitos na crença de que para um ganhar o outro precisa perder.
Em contrapartida, um novo olhar para a cooperação, como forma de todos prosperarem, vem contagiando cada vez mais pessoas que buscam caminhos para influenciar aqueles que ainda não acreditam nesta direção. Mas será mesmo que podemos mudar o outro?
Cambises Bistricky, o Camba, especialista em designer cooperativo e focalizador do Projeto Cooperação e da conversa, acredita que não! E enfatiza: “Não mudamos o outro, então não tente. Mas perceba que eu não mudo sozinho, e nem você. Mudamos quando nos encontramos.” Assim, a possibilidade de mudança ocorre na relação e para todos os envolvidos. Ao nos relacionarmos, impactamos tanto quanto somos impactados e ambos podemos despertar para novas perspectivas, novos entendimentos e somar conhecimentos que nos despertem para novos olhares. Aí vem a mudança!
Uma segunda dica do Camba se baseia no princípio biológico de que os mamíferos aprendem pelo exemplo. Gandhi já sabia disso: “Seja a mudança que você quer ver no mundo”. Então, busque ser o exemplo, transforme-se em um modelo de colaboração para que os outros te admirem e busquem se espelhar em você. Um exemplo que o Camba citou como sutil, mas extremamente significante, foi o de Fábio Otuzi Brotto, também da equipe do projeto Cooperação e idealizador da abordagem conhecida como Pedagogia da Cooperação. “Ele jamais usa palavras bélicas, como ‘ao meu comando’ ou ‘vamos ao debate’. E segue aquilo em que acredita e o leva a trocar ordens por convites e orientações”.
A terceira dica foi: Dedique-se a se conhecer! Fale menos para se ouvir mais. Aproveite as oportunidades para silenciar o ruído externo e mergulhar no seu “eu interior”. E, ainda, utilize o que precisa ser usado pois, “o seu coração sabe, sua alma sabe, sua psique sabe, você sabe. Então, ouça!”.
Refletindo, me lembrei do filósofo Humberto Maturana, que se dedicou a demonstrar que a cooperação é uma característica humana e já começa a se manifestar, na forma coordenada como nossas células colaboram umas com as outras. Então, a essência está em nós, precisamos apenas acessar esse conhecimento.
No decorrer das conversações do encontro virtual, Rodolpho Martins, o Dodô, consultor e especialista em Jogos Cooperativos, chamou a atenção para a necessidade de cuidar do entendimento do que é cooperar e para um olhar mais inclusivo. Segundo ele, é comum ouvirmos “fulano não está cooperando”, quando, de fato, o que está ocorrendo é: “fulano não está fazendo o que eu esperava que ele fizesse”.
Esta confusão se dá a todo o momento e não contribui para um ambiente colaborativo saudável, em que o outro não entra obedecendo, mas acrescentando a sua contribuição para o bem-estar comum. Daí, recebemos a nossa quarta dica: “crie harmonia com quem pensa diferente e aprecie seus motivadores. Vá além da sua fala, perceba suas necessidades e sentimentos e valorize diferentes perspectivas. As diferenças de percepção não significam que as relações não são cooperativas.”
Eu, que estava lá encantada com toda a troca daquele grupo, saí da conversa com uma missão para as próximas vezes que achar que alguém não está colaborando comigo ou com o sistema. Vou buscar respirar e ganhar tempo, para responder internamente a uma outra pergunta: será que estou abraçando a diversidade e buscando entender o outro?
Afinal, conforme as falas de encerramento do Camba:
“Cooperação não é uma ação, mas um estado de espírito e de presença”.
¹ Plantão de Dúvidas da primeira turma do Curso Online “Cooperação para In-Nova-Ação”, pela plataforma Zoom, dedicado à reflexão conjunta sobre os temas do curso.
Inspirações
– “Brincar e Amar – Fundamentos esquecidos do humano”. Humberto R, Maturana & Gerda Verden-Zoller. Palas Athenas: 2004.
– “Jogos Cooperativos – O Jogo e o Esporte como um Exercício de Convivência. Fábio Otuzi Brotto. Palas Athenas: 2013
Por
Carla Albuquerque, consultora e especialista em Metodologias Colaborativas, é focalizadora do Projeto Cooperação.